De comum a ambos, a privação de sono!
Horta Osório reconhece-a como problema
grave, enquanto Jong-un é tido como génio.
Em Londres, disseram que a privação de sono
atingiria cerca de 50% das pessoas. E aqui? Há indicadores alarmantes: 50% das
crianças e jovens têm sonolência excessiva. Diariamente, consulto doentes com
privação de sono/excesso de trabalho.
São de todas as idades, ambos os sexos e todas as
classes sociais. São os que governam e os que são governados. São executivos,
funcionários, assalariados e independentes. São comerciantes e vendedores. São
os que querem subir na vida e os que nela estão altos. São ricos, pobres e
remediados. São os que trabalham por turnos e os que não têm horário de
trabalho. São mães e são pais. São mães separadas com filhos a cargo; são pais
com dois empregos para sustentar a família; são os que fazem tudo para pagar
dívidas e os que exigem pagamentos. São os que exercem cargos de poder e os que
não têm poder nenhum. São muitos...
Primeiro trabalha-se muito porque tem de ser!
Vai-se noite dentro, deitando tarde, levantando
cedo. Ouvem-se elogios. Fantástico! Que energia! Que capacidade! Vêem-se os
resultados. Respostas na hora. O e-mail não espera, os telemóveis sempre
activos. O dinheiro entra ou há-de entrar. O sucesso bate à porta ou irá bater.
Mas... começam os erros, os lapsos fugazes, a
palavra que não vem, o encontro que se esquece, o erro profissional.
Depois vêm a irritação, os nervos à flor da pele.
O bocejar inoportuno, a desatenção. A memória a fugir.
De início, chega-se à cama e dorme-se logo, mas
depois quer-se dormir e não se dorme. Nem de noite, nem de dia. Olhos
escancarados, cabeça em rodopio! Noites brancas, mesmo em férias.
O sono quebrado, a bênção perdida!
O desespero, a depressão, a memória estragada, o
raciocínio manco, o humor deplorável, o “burned out”.
Acontece aos melhores, aos mais bem preparados,
aos mais inteligentes.
Os génios não dormem pouco. Alguns, como
Einstein, eram mesmo dorminhocos.
O sono garantiu a sobrevivência durante milhões
de anos.
O grande beneficiário é o cérebro. O sono
consolida as memórias, a aprendizagem e os conhecimentos abstractos, ajuda na
resolução de problemas, estimula a criatividade e estabiliza as emoções.
Para pensar e estar bem, é preciso dormir!
O corpo é outro beneficiário. Dormir de menos ou
de mais aumenta o risco de diabetes, obesidade, doenças cardiovasculares,
hipertensão, cancro, acidentes e diminui a esperança de vida.
Para ser saudável, é essencial dormir!
São precisas regras e regularidades no dormir, no
comer, no repouso, no exercício. Cuidado, a doença resulta de erros nas regras
da natureza!
São precisos limites, no trabalho, no crédito,
nas despesas, no prazer, no sofrimento, em tudo.
Não somos escravos. Precisamos de pausas ao longo
do dia, de tempo para estar e ser.
Não somos, quais gladiadores, instrumentos para
deitar fora quando nos acomete uma incapacidade.
Aonde chegámos com tanto trabalho, tanto
desassossego, tanto crédito, tanta coisa?
A um país em crise, a uma sociedade doente, com
pessoas tristes sem futuro à vista.
Aonde irá chegar Kim Jung-un, sem controlo nas
suas estratégias bélicas, desafiantes e impulsivas? Quais os sofrimentos
indizíveis a que levará o seu povo? Quanta dor, tristeza, devastação se
disseminará por aquela região?
Será tudo isto o trabalho de um cérebro genial ou
antes o resultado final de um cérebro com graves problemas de decisão e
tendências impulsivas/agressivas, agravadas pela privação de sono?
Deus descansou ao sétimo dia e nós não somos
certamente deuses.
Professora Teresa
Paiva
Lisboa, 5 de Abril de
2013
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2 comentários:
Dra. Teresa, tem toda a razão.
Vivemos numa sociedade cada vez mais doentia do ponto de vista físico e psicológico. No geral, fomos educados naquela mentalidade cristã de que o trabalho dignifica e que o ‘salário’ é a recompensa do nosso esforço. Eu até concordo com esta postura e, quando era criança, a minha Avó contava-me sempre aquela história pedagógica da ‘cigarra’ preguiçosa que passava todo o Verão a cantar em cima de uma árvore enquanto a ‘formiguinha’ trabalhadora acumulava comida e construía a sua casa… Quando chegava o Inverno, a ‘cigarra’ estava cheia de frio e a ‘formiga’ tinha conseguido proteger-se :) - Eu concluía que valia mais sermos como a ‘formiga’ previdente, poupada e esforçada. - E é engraçado que, passaram-se tantos anos, mas estas histórias infantis povoam o meu imaginário e estão subjacentes à minha maneira de ser. Além disso, elogia-se mais alguém que está ocupado e é trabalhador do que aquele que anda na preguiça e que espera alcançar tudo sem sacrifício. Realmente, parece que consideramos o trabalho como um dever que traz mérito e, pelo menos, eu não me sinto bem com a minha consciência se não fizer nada de útil. Claro que podemos cair, tal como refere, no excesso de trabalho e valorizar apenas os méritos, as honras ou vaidades, ou ainda pior, o apego aos materialismos… Se uma pessoa trabalhar demais não só prejudica a saúde como não tem tempo para cultivar as amizades ou manter laços com a família. Quanto a mim, sinto que talvez em muitos casos, o indivíduo trabalha demais não apenas para ganhar dinheiro, naquela ganância terrível, e parece-me que vê no trabalho um ‘refúgio’ para a sua infelicidade. Vejo tantas pessoas infelizes à minha volta que se agarram ao trabalho para não terem de pensar em problemas. No fundo, o trabalho pode tornar-se escravizante, pode tornar-se uma dependência ‘workaholic’, mas pode ser igualmente um ‘entretenimento’, uma fonte de prazer e de encontrar um sentido para a vida, de fazermos algo útil pelos outros.
Eu considero a sua profissão de médica, mais do que uma profissão, um ‘sacerdócio’, uma devoção e uma doação incrível! Acho que deve ser difícil, no caso de um médico, ter um horário de trabalho, visto que acaba por sentir isso como uma espécie de ‘missão’. Nestas situações, o trabalho torna-se nobre e até é compreensível o excesso… Agora trabalhar demais somente por causa de dinheiro, colocar essa moeda acima dos sentimentos é mesmo uma degradação da ‘alma’ das pessoas. Qualquer dia, seremos como ‘máquinas’ e ‘computadores’ que executam funções, sem vida e sem ‘alma’. Deve ser isto que estes 'políticos' esperam de nós, ‘robots’ em vez de ‘pessoas’… como naquele filme americano "Matrix". (de Joana Macedo Luís)
Cara Joana
Gostei muito do seu comentário, que me acho muito lúcido, muito claro e muito "sentido".
O problema é que trabalhar para não sentir infelicidade, faz-nos entrar numa espiral de infelicidade e de solidão, e no fim do caminho o problema é pior que no princípio.
Gostava de dizer que qualquer pessoa, médico, sacerdote, missionário, etc, etc, se não cuidar de si também não vai estar em condições de cuidar ou de ajudar outros. Por isso todos temos que ter regras de bom senso, ter limites e descanso.
Ficarei muito contente de continuar a ouvir as suas opiniões e obrigada por as dar
Um abraço , com amizade Teresa Paiva
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